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APARAS DE ESCRITA: "RESIGNADOS, OU CONSCIENTES E ACTIVOS?"

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quarta-feira, outubro 16, 2002

"RESIGNADOS, OU CONSCIENTES E ACTIVOS?"

Abissus abissum.
Se acreditarmos que um mal atrai outro mal, percebemos a razão porque é muito raro que a violência não atraia mais violência, geralmente de intensidade redobrada, indiscriminada, generalizada, de alvo difuso ou inocente.
A violência, hoje, envolve-nos como uma neblina, às vezes, mesmo, como um nevoeiro; convivemos em intimidade com ela; é um dado adquirido; tornou-se num lugar comum, tão comum que nos deixamos conduzir placidamente para a comodidade cega do esquecimento de que a violência existe...
Esquecer a violência quotidiana tornou-se num objectivo - mesmo que a utilizemos, mesmo que, nalguns casos que queremos ignorar, nos toque pela porta. Ignorar a violência que se desnuda a cada momento perante quem está exposto ao dia a dia - e quem não está? - faz parte da preocupação de quem quer sentir-se despreocupado.
Fingir que não há violência nos cartazes publicitários que nos manipulam com apelo ao que de mais mau, adormecido e inquestionado, está em nós: a competição de faca na boca entre os Bancos e entre as Seguradoras pela maior fatia de mercado a vampirar, sabendo que os dramas decorrentes das dívidas serão a fonte de receita; a competição entre donas de casa pelo melhor frigorífico a exibir, sabendo que nem sempre há com que o encher; a competição entre automobilistas pelo carro mais, sabendo que a gasolina mal chega para o fim-de-semana e, mesmo assim, usurpando necessidades mais prementes; a competição entre os musculados do sexo, sabendo que o sexo assim vivido é um preservativo imposto que dá pelo nome de impotência.
Fingir que não há violência na visão matinal dos sem abrigo que se escondem dos restos da noite nos restos de caixas e caixotes de cartão, à porta de edifícios onde os negócios prosperam ou o lazer caro alicia os que a ele podem ter acesso.
Fingir que não há violência quando seres humanos esfomeados procuram, como caçadores furtivos, restos de alguma côdea que tenha escapado a cães e gatos nos contentores do lixo.
Fingir que não há violência por detrás dos óculos de sol, em pleno Inverno, que tentam disfarçar a nódoa negra que um punho desbragado fez explodir naquele rosto de mulher.
Fingir que não há violência no choro revoltado de crianças que suplicam um sono necessário, ou a luz do sol a ondular na relva, perante a indiferença dos pais centrocomercial-dependentes.
Fingir que não há violência quando o espaço verde à frente de nossa casa, o espaço dos garotos e da nossa tranquilidade, é atropelado por rodados impúdicos de algum vizinho que não leva o carro para a mesa-de-cabeceira por mera impossibilidade física.
Fingir que não há violência perante a belíssima casa, um álbum de história de famílias, de muitas gerações, agora transformada num montão de ruínas de pedra e dignidade porque o actual proprietário espreita o momento ideal de transformar afectos em tostões.
Fingir que não há violência no palavrão-faca, na buzina-granada, na manobra de alto risco do automobilista que só consegue afirmar-se como vivo num volante potencial de morte.
Fingir que não há violência no encontrão sem reparo, seja no que partilha o transporte colectivo connosco, seja no que partilha a carreira profissional connosco, seja no que partilha a cama connosco.
Fingir que não há violência na obscena exposição de notícias de violência, elas próprias mais violentas do que a violência relatada, nessa enormidade de exploração dos sentimentos para tentar um aumento de audiometrias de televisões e de rádios e de tiragens de jornais, todos eles vendedores de desgraças.
Fingir que não há violência na hipocrisia do discurso dos políticos, falacioso, mentiroso, fraudulento, políticos mais preocupados com os seus interesses pessoais do que com os cidadãos cujos interesses dizem - e deveriam - representar e defender.
Fingir que não há violência no elevado índice de analfabetismo estrutural que tolhe o sentido crítico, relega para o desleixo a reflexão e torna a pessoa joguete de manobras e políticas que pretendem, apenas, manter o estado de coisas - leia-se, os privilégios de uma minoria que há muito perdeu o sentido da solidariedade e de serviço ao seu semelhante, ao seu Povo.
Fingir que não há violência na insegurança no trabalho, já de si precário num mundo em recessão, à procura de balões de soro para sobreviver no caos da desigualdade e da injustiça sociais, num mundo onde o trabalho deixou de ser dignificante para ser alienante, trabalho tornado ainda mais precário por legislação laboral que faz pairar, permanentemente, sobre os braços e a cabeça dos trabalhadores o fantasma do despedimento iminente, individual ou colectivo.
Fingir que não há violência na magreza da maioria das pensões de reforma que mal chegam - e, em muitos casos, não chegam - para pagar os medicamentos e os tratamentos necessários a, ao menos, alguma qualidade de vida no fim da vida.
Fingir que não há violência quando a saúde é considerada mera mercadoria e a doença é tratada em vez de prevenida, seguindo, também aqui, a lógica do cifrão.
Fingir que não há outras e dilacerantes violências?
Fingir que é mentira que um mal pode atrair outro mal...
E, de tanto fingimento, finge-se desconhecer a razão por que a violência eclode quando, onde e da forma que menos se espera...
Se, até agora, tem sido possível fingir, foi porque deixámos que a violência se instalasse como companheira e companhia e que, prepotente, desinstalasse o Amor.
E o Amor esvai-se, doente ele também, sem reforma possível, sem remédio, sem abrigo, esfomeado, sem eira nem beira, escondido, envergonhado, sem saber se pode dar-se, a quem, a quem quer dar-se, tantas vezes esmolado sem eco, de tão universal tão esquecido... como a violência, de tão lugar comum quase esquecida... pólos da mesma linha, linha de Vida mal vivida se o Amor não render a Violência.
Mas, se abissus abissum, também o Amor pode atrair o Amor, do outro lado da estrada... É uma questão de se escolher entre "Resignados, ou conscientes e activos?"...

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