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APARAS DE ESCRITA: A VERGONHA TAMBÉM SE APRENDE

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domingo, junho 05, 2005

A VERGONHA TAMBÉM SE APRENDE

"Que falta de vergonha!" - é o comentário que ouvimos ao nosso vizinho quando algum político que acaba de ser indiciado por roubo de dinheiros públicos aparece na televisão envolto numa aura de sorrisos e acenos inocentes.
"Tenha vergonha!" - é o que dizemos quando o mesmo político, depois de provado o crime, afirma convicto que tudo não passa de uma tramóia da oposição.
Parece, pois, que a vergonha é qualquer coisa que pode estar em déficit ou em ausência absoluta num cidadão, mas que é possível, e mesmo aconselhável, ter em quantidade certa para os gastos diários. Ou seja, permite ser adquirida, utilizada, dosada, esquecida, gasta, perdida, enfim, trabalhada.
Como não está à venda em bazares, apesar de nos bazares se encontrar de quase tudo, aonde ir procurá-la?
As vergonhas enraizadas em factos irreversíveis, um defeito físico, ou socialmente irrelevantes para a maioria dos observadores, como a altura, ou, ainda, modificáveis pelo treino perseverante, um defeito de dicção, por exemplo, as tais vergonhas que são uma vergonha uma pessoa ter, como se diz em crónica anterior, são aprendidas, ou incutidas, o que vem a dar no mesmo, em diferentes fases da vida.
Quando se recorre ao psicólogo para dirimir o mal-estar resultante dessas vergonhas, ou das dificuldades no relacionamento que essas vergonhas causam, o que se lhe pede é que nos faça desaprender esses comportamentos e aprender e automatizar outros em sua substituição (criar hábitos, afinal), na prática de todos os dias. A vergonha de ser magro pode tornar-se no brio da elegância, um estrabismo pode ser ofuscado pelo dom da palavra ou o senso de humor.
Porém, curiosamente, não há notícia de que alguém tenha recorrido ao psicólogo, ou a outra fonte similar, mais ou menos similar, para "aprender vergonha", talvez, em parte, pela vergonhasinha de declarar, mesmo em segredo de clínica, "eu não tenho vergonha nenhuma". Para além disso, e principalmente por isso, porque também não há notícia de que a falta de vergonha causasse qualquer transtorno ou constrangimento ao próprio - são sempre terceiros a sofrer as consequências dessa falta. Não é em vão que um velho ditado português diz que "de quem não tem vergonha toda a Terra é sua". Na verdade, o desavergonhado passeia-se pelo mundo, desenvolto, descarado e impudico, sem sentir necessidade de um buraco para esconder as suas torpezas.
A vergonha, como componente ética de uma pessoa, de uma família, de um organismo ou de uma nação, é um legado. Como tal, tem canais próprios de aprendizagem.
É verdade que aprendemos uns com os outros na interacção social, mas certos atributos da personalidade são mais facilmente aprendidos em sede própria por serem essas sedes modelos de cópia providos de um estatuto especial. Estão neste caso a mãe, o professor, o chefe e o governante, todos eles, à sua escala, líderes de grupos, e no pressuposto óbvio de que comportam em si e são capazes de transmitir os valores agregados ao conceito de vergonha.
A mãe é, geralmente, a pessoa que, na família, mais tempo dedica aos filhos e que, por isso mesmo, durante mais tempo inculca nos filhos normas, regras e referências. Não será alheio a isso o tempo de nove meses que disponibilizou da sua vida para a gravidez. Apesar de toda a sobrecarga de trabalho, no lar e fora dele, é o elemento que mais livre tem de estar, ou de se mostrar, para o seu agregado, por exigência dele mesmo, embora essa exigência possa ser sub-reptícia. A missão complexa de principal administradora dos afectos na família dá-lhe o carisma de um líder, sem título mas com autoridade.
Na escola, o professor é um chefe indiscutível de um grupo com características especiais, e deveria ser não só um chefe como um líder. Para além da sua função específica de ensinar a aprender e de fornecer informação, tem ainda a missão, muitas vezes esquecida, de incutir normas, regras e referências em complemento da família e cooperando com ela neste aspecto.
O chefe, seja qual for o grupo, militar, religioso, profissional, sindical, desportivo, recreativo, transmite normas, regras e referências específicas do grupo que deve liderar.
Quanto ao governante, chefe dum executivo político-administrativo de cujas acções decorrem consequências que afectam a vida de todos os cidadãos, espera-se que ele verta, ao longo da sua governação, normas, regras e referências.
Entendo serem estes os principais canais que, na sua prática diária, devem, como modelos, proporcionar a aprendizagem da vergonha, vertente moral do relacionamento humano.
Da consulta das estatísticas demográficas, posso deduzir que mães há muitas, uma vez que somo 6 milhares de milhões de habitantes no planeta.
Pelas notícias verifico que há tantos professores que alguns milhões se encontram no desemprego em todo o mundo.
A avaliar por religiões, batalhões, profissões e recreações que constam das enciclopédias, de chefias não há carência.
Finalmente, de dois em dois anos, e considerando apenas o país em que vivo, fico a saber que de governantes nunca havemos de ter falta.
Permito-me, pois, concluir que se não faltam canais para a aprendizagem da vergonha, a manifesta falta de vergonha que se verifica em todos os planos e sectores terá de residir na adequação de alguns desses mesmos canais à sua função de transmissores dos valores que devem integrar a sociedade e servir de suporte ao relacionamento, privado e público.
Então, se isto for verdade, torna-se necessário e urgente relembrar a esses canais que a vergonha também se aprende.

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